Nkaringana

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A exposição Nkaringana, que inaugura no dia 29/11 no Museu Afro-Brasileiro da Universidade Federal da Bahia - MAFRO/UFBA e no dia 30/11 na Casa do Benin, apresenta processos de investigação artística realizados em diálogo com os acervos dos dois lugares. 

 

O MAFRO, concebido por Pierre Verger, reúne uma coleção fruto de deslocamentos do artista entre países africanos e o Brasil, bem como objetos da cultura material africana e afrobrasileira, adquiridos ou doados ao museu. Com peças provenientes da África Ocidental, Central e Oriental, o museu enfatiza os laços culturais que ligam a cultura africana à brasileira, buscando contribuir com a (re)valorização da cultura negra e a construção de uma memória afro-brasileira em Salvador. A Casa do Benin foi instalada em 1988, com a intenção de reatar relações diplomáticas e promover trocas horizontais e recíprocas entre o Benin e o Brasil, buscou-se possibilitar um intercâmbio pós colonial entre os dois lugares. O espaço possui um acervo artístico e cultural africano e afrobrasileiro resultante de trocas entre a Bahia e o Benin. Tais acervos possuem uma importante contribuição para o nosso conhecimento sobre lugares, práticas e saberes. 

 

Sete projetos de investigação foram selecionados em uma chamada realizada entre junho e julho deste ano. Durante quatro meses ocorreu uma série de atividades, de modo a criar um ambiente propício para o desenvolvimento da pesquisa de cada participante. Houveram seminários, debates coletivos realizados em parceria com o Goethe-Institut Salvador-Bahia e encontros com interlocutores, entre estes curadores, artistas visuais, pesquisadores e escritores, possibilitando a interlocução com diversos pontos de vista. A exposição resultante desse processo, com a contribuição de convidadas(os), procura fomentar olhares reflexivos e estimula abordagens contemporâneas das artes visuais para ativar outras perspectivas sobre o acervo.

 

A palavra 'totem' define o símbolo de um determinado agrupamento, e é assim que se formam as obras Totem a um museu afro-brasileiro I, II e III, de Isabela Seifarth, a partir de um acúmulo de imagens de esculturas encontradas em acervos de museus afro-brasileiros. Em uma referência estética pode-se ter alusão às esculturas de máscaras africanas como as geledés e suas super-estruturas, ou os painéis de madeira entalhados de Manoel do Bonfim ou Carybé com as figuras amontoadas, transformando essas referências tridimensionais em obras bidimensionais com uma pigmentação que gera dúvidas sobre a sua materialidade. A obra Acúmulos de um museu afro-brasileiro é um vídeo que traz desdobramentos dos totens, revelando a acumulação material e imaterial, obras de arte e memórias dos museus.

 

Contrafluxos é parte da série Brésiliens Agudás, iniciada pela artista visual Luisa Magaly. Consiste na reunião de vestígios investigativos acerca dos afro-brasileiros que foram deportados ou retornaram à África entre meados do século 18 e início do século 20, após uma série de revoltas populares, destacando a Revolta dos Malês, na Bahia, em 1935. O retorno aponta para uma outra diáspora, onde as manifestações culturais brasileiras existentes no Benin, Togo, Nigéria e Gana são os principais indícios da presença das comunidades Agudás, Brésiliens, Amarôs, ou Tabons ─ variações de denominações dadas aos retornados ─ nesses territórios.

 

Adriano Machado investiga pessoas, acontecimentos e relações que ocupam o cotidiano e os arredores da Casa do Benin. Debruça-se principalmente sobre a dinâmica de corpos racializados diante das políticas de segurança e visibilidade, construindo um arquivo que descreve rotas e trânsitos, aspectos fundantes na constituição dos acervos pesquisados.

 

Incorporações afetivas é como se chama o projeto de Mário Vasconcelos. Mitos, ritos, contos, cantigas e costumes sempre fizeram parte do universo afrodiaspórico. O presente trabalho construído colaborativamente com mulheres negras, propõe um retorno à memória, um acordar aos sentimentos; ora velados, ora expostos, tais relatos são expressados visualmente através de estatuetas concebidas tendo como principal ativador as bonecas Akuabas. Para a exposição, as bonecas serão apresentadas em uma instalação que projeto os sons dos depoimentos produzidos nas oficinas.

O projeto de Marcos Rocha Sá, ‘Vestíveis de Memória’, baseia-se em releituras de obras pertencentes ao acervo do MAFRO e ao Museu Casa do Benin, a fim de criar objetos interativos. Tais objetos são uma espécie de penetráveis vestíveis – objetos para vestir – feitos a partir da combinação de materiais precários (papelão, sacos de lixo etc.), que se reorganizam a partir de elementos da religiosidade afrobrasileira, e resultam em experiências sensoriais. 

 

Com o projeto Objetos com raízes (ou “não diga que não existe, procure onde está), Lia Krucken nos convida a refletir sobre objetos e seus mistérios. A partir do encontro com um recadé (ou recado, em português), a artista inicia uma investigação que atravessa espaços geográficos, simbólicos e temporais. Alguns objetos podem ser pensados como objetos de resistência, que sobrevivem e chegam até nós, hoje. São objetos que constituem uma mensagem em si mesmo e só podem ser lidos por quem souber ler. Portanto, também nos falam do intraduzível, e do que não se pode alcançar quando a forma de entender que usamos é o pensamento e a razão. Assim, transcendem ao que se vê e tem raízes ancestrais, guardando em si diversas possibilidades interpretativas.

 

O processo desenvolvido pela dupla Lucas Feres e Lucas Lago explora a relação entre acervo, arquivos e arquitetura da Casa do Benin. Assim, tomando o museu como território específico para a criação artística, procura repensar a ficcionalidade dos processos de construção de imaginários de nação e o quanto estes são correlatos aos imaginários coloniais e aos projetos modernistas. A partir disso produzem uma série de intervenções no local com as instalações Monumento ao coqueiro e Canteiro de obras, bem como o vídeo Caminhos de Maní, refletindo sobre as rotas de objetos e pessoas pelo Atlântico Sul.

 

Fruto de uma colaboração criativa entre o fotógrafo Pedro Silveira e a artista visual Aislane Nobre, o projeto Diáspora Sagrada* investiga a presença de entidades africanas no Brasil, especialmente no território da Baía de Todos os Santos. Para a exposição, a dupla apresenta uma série de imagens em processo, realizadas com intervenções sobre as fotografias de peças da coleção Estácio de Lima, cuja origem remonta à extinta Delegacia de Jogos e Costumes, conhecida por promover violência institucional de Estado em territórios e comunidades de culto. Estes apagamentos realizados nas fotografias se mostram tanto estéticos quanto conceituais, considerando que esta coleção carrega uma origem perversa. Neste sentido, as intervenções com cores e desenhos sobre as fotografias se apresentam como uma tentativa de reanimar estas peças e retirá-las da sombra em que se encontram há décadas nestes acervos.

 

Em um carta intitulada “O sol nasce por Guiné”, Tiago Sant’Ana, interlocutor e convidado para exposição, escreve impressões sobre duas margens do Atlântico - a da Bahia e a da antiga região intitulada de Costa da Mina. A carta, com sua natureza de endereçamento tendo uma origem e um destino, serve como ponto de partida para tratar paradoxalmente sobre as incertezas das travessias e diáspora das pessoas negras para o Brasil.

 

 

A convidada Tina Mello, a partir da instalação Afoju ou Para ver Joana e no vídeo Ocidente/Incident busca o diálogo entre territórios separados e unidos pelo Atlântico,  refletindo sobre a consciência afro-diaspórica em reverberação com as reformulações do imaginário anti-colonial presente nas práticas cotidianas da região ashanti. 

 

Na obra Espíritos d’água da convidada Yohanna Marie, algumas mulheres da Região Ashanti foram convidadas a recriar a partir de seus próprios corpos imagens de espíritos da água com os quais tiveram contato. Para a artista “Os espíritos d’água querem falar. E eles falam através das vozes das mulheres”, o que provocou a construção de imagens que envolvem a fotografia digital e materiais diversos. 

 

*Projeto viabilizado com apoio da Magnum Foundation e Henry Luce Foundation.

 

SERVIÇO

Intervalo - fórum de arte

Exposição Nknaringana: histórias em trânsito

 

Abertura

Museu Afro-brasileiro UFBA - 29/11 às 18h

Casa do Benin - 30/11 às 12:30

 

Visitação

Museu Afro-brasileiro - 29/11/19 a fev/2020

Segunda à sexta das 09h às 17h

 

Casa do Benin - 30/11/19 a dez/2019

Terça a sábado - 09h às 17h

 

Endereço

Museu Afrobrasileiro - Largo Terreiro de Jesus, s/n

Casa do Benin - Baixa dos Sapateiros, 7 - Pelourinho, Salvador

Imagem Ilustrativa: 
Ano: 
2019